Uma Bengala na Multidão
Os meus passos
perdiam-se entre a multidão e os toques da minha bengala branca que como um
detector de percursos e de obstáculos me fornecia todas as indicações necessárias
para tornar o meu caminho o mais seguro e tranquilo possível. Andar em Lisboa,
aprender aqui é mais fácil do ponto de vista da impessoalidade, somos apenas
mais um na enorme multidão, a minha aprendizagem flui de forma mais física, a
minha parte emocional não acusa qualquer constrangimento, qualquer incomodo que
interfira ma minha concentração ou que gere
tensões acrescidas aquelas que já enfrentamos naturalmente e que advêm
desta nova complexa e difícil condição de cegos.
Os desafios são enormes,
talvez mesmo gigantescos, do ver pouco ao não ver vai uma distância brutal, e no
caso da mobilidade, uma das nossas maiores obsessões, passa a ser absolutamente
necessário criar novos mapas mentais memo dos sítios ou percursos que antes conhecíamos
tão bem mas, agora de pouco nos serve uma vez que na maioria dos casos nos
guiamos por pontos e referências que nada têm a ver com aquilo a que estávamos
habituados. A pouco e pouco vamos fazendo de cada pequeno espaço um pequeno
mapa que juntamos a outro e mais o teu e ainda outro, assim vamos obtendo um
mapa maior e percorremos os seus pontos até atingir o nosso objectivo. Atenção,
concentração, e muita calma assim chegamos lá.
No meio desta cidade enorme
e onde não somos um alvo de observação tudo é mais simples, tão mas tão mais
simples. Aqui ninguém nos vê, ninguém nos aponta o dedo, raramente alguém dirá
"Olha ali vai aquele (ou aquela) está ceguinho coitado!", aqui na
grande cidade os olhares não pesam, não nos esmagam nem nos fragilizam, tão
pouco os comentários murmurados e num sussurro esteriofónico interferem no
nosso caminho,... É ou não verdade? E isto dói mas, mais que doer ou magoar
pode e em muitos casos leva mesmo a que algumas pessoas se refugiem se escondam
por não ser fácil enfrentar esta pressão constante que desalinha, destrói todo
o trabalho que tiveste a reaprender a viver e de repente tudo se desmorona como
um frágil castelo de cartas.
Também para mim chegou
esse dia e depois de ouvir tantas destas histórias questionava-me muitas vezes
sobre ou qual seria a minha reacção como me iria sentir perante a reacção das pessoas,
como iria eu reagir? No meu caso, a minha grande preocupação é saber e
reconhecer o caminho, criar um novo mapa pois que o meu conhecimento local de
pouco me serve neste momento. As pessoas falaram sempre tal como na história do
velho, do burro e do moço, nem adianta ouvir mas se aliviar e for terapêutico
dar uma boa resposta ajuda sempre. Pensa sempre primeiro no teu objectivo e
como cumprido, seja um pequeno caminho ou um objectivo maior, e vai, vai em
frente pelo que acreditas, pelos que amas e por ti próprio.
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